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Há uma luz no fim do poço?

Resumo

Um analista de equities é um artesão.

O valuation é a ferramenta do analista. A tese de investimentos que é o “artesanato” final. A tese sempre é algo novo e único, pois depende da “mão” do analista na hora das projeções e expectativas. A tese é o crochê, o valuation é a agulha e o analista, neste caso, é uma idosa amável.

Uma tese de investimentos tem duas bases: a parte qualitativa e a parte quantitativa. Ou, como o grande mestre Damodaran chama, são as narrativas e os números.

E aqui sempre surge um ponto vital no mercado: valuation (no sentido de preço justo) não é o gatilho para o preço andar.

No Almanaque de hoje, vamos entender um pouco sobre a petroleira queridinha da bolsa que já começou a tirar a paciência de muitos investidores. A aplicação das Narrativas e Números na prática para tentar encontrar gatilhos.

Narrativas, Números e Petróleo

Um analista de equities é um artesão.

No dicionário Michaelis, artesão é o “ Indivíduo que produz, por prazer artístico ou profissionalmente, trabalho que depende de habilidade manual”. 

Muitas pessoas acabam focando muito no aspecto “manual”. Mas o ato de produzir arte envolve também um enorme esforço intelectual em alinhar as referências anteriores e a habilidade manual para criar algo novo e único. Sendo assim o valuation é uma arte, certo?

Errado.

O valuation é a ferramenta do analista. A tese de investimentos que é o “artesanato” final. A tese sempre é algo novo e único, pois depende da “mão” do analista na hora das projeções e expectativas. A tese é o crochê, o valuation é a agulha e o analista, neste caso, é uma idosa amável.

Uma tese de investimentos tem duas bases: a parte qualitativa e a parte quantitativa. Ou, como o grande mestre Damodaran chama, são as narrativas e os números. 

Narrativa é a história que você está contando: “o que é o ativo e para onde ele vai?”. A narrativa exige imaginação por parte do analista, o que a faz ser um pouco preterida em um mundo pragmático. Por outro lado, os números trazem exatidão para navegar em um universo de incertezas, o que pode dar uma sensação de prisão para o mundo criativo.

Com dois lados antagônicos desse “ying-yang” do mercado financeiro, o valuation é a ponte que une os dois. Sem narrativa, a tese pode ser pragmática e enviesada com dados do passado. Sem os números, a tese pode “ir para Nárnia” e não condizer com a realidade. Assim, o valuation torna a tese balanceada e aproveitável.

E aqui sempre surge um ponto vital no mercado: valuation (no sentido de preço justo) não é o gatilho para o preço andar.

Primeiro, o mercado eficiente é apenas uma hipótese. Na vida real, vemos várias assimetrias que abrem oportunidades para bons retornos. Segundo, existem papéis que estão “baratos” e vão continuar assim, seja pela narrativa ruim, seja pelos números se deteriorando, apesar de ainda ter um bom patamar. Por exemplo, em uma consulta no terminal Bloomberg, os papéis da Azul (AZUL4) possuem um upside médio de 209% enquanto amargam uma queda de mais de 70% no ano. Quem está errado: o analista que vê upside em uma tese mal vista ou o mercado? 

A resposta é complexa, mas no final o mercado é soberano, na forma de fluxo. Não interessa se você está vendo um potencial de valorização de centenas. Se não houver fluxo comprador, o papel não andará.

Nessa linha, a Prio, que é reconhecida por ser uma das melhores empresas da bolsa e ter entregue uma alta de mais de 1.000% nos últimos 5 anos, está numa maré baixa e caindo mais de 10% no último mês, sendo a pior performance do setor. Enquanto isso, o upside médio na Bloomberg é mais de 50%.

No Almanaque de hoje, vamos entender um pouco sobre a petroleira queridinha da bolsa que já começou a tirar a paciência de muitos investidores. A aplicação das Narrativas e Números na prática para tentar encontrar gatilhos.

O que aconteceu?

A queda no ano da Prio parece uma ressaca depois de um bom momento no final do ano passado.

Tudo começou com a greve do IBAMA. Apesar de ter começado oficialmente em julho, o órgão estava em paralisação parcial (como uma velocidade de cruzeiro), desde o início do ano. Foram 8 meses de greve. O IBAMA é um órgão muito relevante para várias indústrias, pois muitas só podem operar após as liberações deles. 

O grande problema da Prio veio por conta disso. No final de 2020, a Prio comprou o campo de Wahoo, na costa capixaba, por US$ 100 milhões pelos 35,7% que a BP tinha. Porém, na época, o poço ainda estava pré operacional e a Prio investiu sozinha para operacionalizar. 

Pois bem, os investimentos ficaram prontos no início de 2024. Aliás, a própria Prio fez um evento para apresentar o projeto e disse que esperava que começasse em breve: 

Para melhorar tudo, como a Prio desenvolveu o campo sozinha, o contrato previa que a empresa ficasse com tudo. E foi o que aconteceu em abril, quando o tribunal julgou a decisão favorável para a empresa.

Só faltava o IBAMA… E ainda falta. O órgão ainda não emitiu a licença para a empresa perfurar e entrar em operação comercial. Com isso, a previsão é que passe a operar apenas em meados de 2025. A expectativa no início do ano era que começasse em agosto de 2024.

Para ajudar mais a má fase, a produção ficou muito abaixo do recorrente em vários meses deste ano por questões técnicas. O campo de Frade passou por manutenção programada (e aí tudo precisa parar). Por conta de um problema de equipamento, 3 poços no campo Polvo+TBMT ficaram parados e dependendo da liberação do IBAMA para voltar (apenas 1 voltou). Albacora Leste também teve problema no equipamento, o que fez a produção reduzir bastante também.

E nada do IBAMA voltar. Como se pode ver pela imagem, a produção deste 3T24 realmente está muito abaixo do normal. Assim, a Prio que era a queridinha de muitos, passou a gerar muita ansiedade nos investidores.

Por fim, recentemente ainda tivemos um movimento bem forte de queda no Petróleo Brent. A commodity fechou o dia 10/09/24 abaixo dos US$70 pela primeira vez em muitos meses.

Lendo este panorama, parece que temos um cenário de caos e que o melhor a se fazer é operar contra a Prio, certo?

Bem, aqui é onde vem a hora do artesanato.

Olhando num curtíssimo prazo, realmente a Prio não tem perspectivas boas e deve entregar um resultado do 3T24 bem abaixo. Por isso, é de se imaginar que as quedas recentes na ação são o próprio mercado antecipando este resultado ruim. Além disso, no âmbito dos investidores institucionais, está virando comum ver operações estruturadas (combinando opções) que esperam uma queda no ativo para este mês de setembro.

Porém, estamos falando de um curtíssimo prazo. Aqui, a incerteza e a volatilidade são maiores.

Então vamos complementar a narrativa com mais informações e números:

Primeiro, a Prio é uma empresa de crescimento. Como falamos no último Almanaque, eles não focam em distribuir dividendos. Isso permite que eles foquem no crescimento da própria empresa, seja com melhorias operacionais (como comentamos de Wahoo), seja com operações de M&A.

Aliás, em média, a Prio faz 1 M&A por ano e há 2 anos que não vemos uma grande aquisição da companhia. O rumor mais forte hoje é da compra de uma parte do campo de Peregrino da Sinochem. O campo sozinho produz cerca de 94 mil bpde, o que é quase toda a produção da Prio. Como a Prio está com cerca de R$ 4 bi em caixa, fora os valores a receber, e a empresa não pretende distribuir dividendos, o cheiro do M&A fica mais forte a cada dia.

Sobre os números da empresa, é preciso compreender as fortalezas de uma empresa de commodity. Como, em tese, essas empresas vendem o mesmo produto pelo mesmo preço, o grande diferencial que elas terão entre si é a eficiência operacional. Ou seja, fazer mais com menos.

No setor de petróleo, essa métrica reside no custo de extração, ou lifting cost.

Como podemos ver pela imagem, o lifting cost da Prio atualmente é de US$ 7,6 (mais barato que um almoço aqui na Barra da Tijuca), cerca de 3x menor que o da Brava Energia (antiga 3R), que tem uma capacidade produtiva maior. Entre quantidade e eficiência, sempre priorize escolher o caixa.

Indo para outras comparações, a Prio também se destaca em várias métricas de retorno:

Quem está certo?

Como vimos, os fundamentos da Prio são excelentes e o histórico corrobora com isso. A narrativa em um curto prazo realmente não é boa, mas quando se faz um valuation, a projeção é de vários anos para frente. 

Como se vê pelo valuation do mercado, a empresa teria um potencial de retorno de mais de 50%, sendo que existem casas dando preço justo acima dos R$ 75, o que é um retorno de mais de 80%, levando em consideração o preço de fechamento do dia 10/09/24. 

Mas o papel não para de cair. E aí, quem está mentindo?

Após toda reflexão sobre narrativas e números, é possível fazer a leitura de que ninguém está mentindo. A narrativa para hoje é de um copo meio vazio, com a demora do IBAMA e de prováveis resultados ruins para o 3T24. A narrativa longa já abre mais espaço para uma performance melhor, com a empresa conseguindo a liberação e colocando todo seu know-how nos novos poços.

“Então a Prio só precisa pegar a licença do IBAMA, operar seus clusters no máximo, furar Wahoo e comprar Peregrino que tudo vai subir?”.

Em tese sim, só precisam combinar com os russos… As projeções do início do ano eram as melhores possíveis até chegar a essa má fase. O mercado de commodities não deixa ninguém confortável.

Enquanto isso, parece que o mercado não está tão confortável com o benefício da dúvida. Será que nosso valuation está assim também? Aí somente os clientes da Options Research vão saber.

Abraços e bons negócios.

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